• Como devo fazer para mostrar a meu pai que algumas coisas devem ser mudadas na clínica?
• Como fazer que meu filho perceba todas as dificuldades que temos na administração da nossa clínica e se prepare para assumi-la no futuro?
São duas perguntas frequentemente feitas por médicos – que carregam outros questionamentos profundos…
Como encarar a questão da entrada de um filho, uma filha ou parente de nova geração na clínica ou no consultório? Será que o provérbio tão citado “manda quem pode, obedece quem tem juizo” é aplicável nessa situação?
É claro que cada consultório ou clínica tem suas características próprias, sua história e seu jeito de estar presente no mercado. Da mesma forma, cada dono de consultório ou clínica deve decidir seus objetivos, onde quer chegar e como fazer isso. Essas definições serão chave para definição do rumo do negócio.
Quando pensamos em viajar de férias, por exemplo, definimos como será essa viagem: para onde vamos, quem vai, quanto tempo vamos ficar, qual o orçamento, qual tipo de transporte será usado e assim por diante…
Cada decisão dessas tem seus desdobramentos e consequências. Assim, pode ficar difícil estabelecer uma ordem, prioridade ou método que garanta uma orientação rumo ao sucesso da viagem… o que nos leva a uma pergunta essencial: O que define o sucesso de uma empreitada, como uma viagem ou da administração da clínica ou consultório?
Para começar a fazer esse exercício, sugiro entender os papéis dos sócios, para que possam refletir sobre a continuidade de seu negócio:
• Sócio – que investe seu capital e recebe lucros e dividendos como forma de remuneração;
• Médico – que atende seus pacientes e recebe por essa atividade seus honorários;
• Administrador – que se preocupa e toma decisões administrativas, financeiras e de todos os riscos na operação do negócio;
• Pessoa – que com todas as suas emoções toma decisões de todos os tipos, inclusive e principalmente as dos tópicos acima.
Na perspectiva da sucessão de comando e de propriedade da uma clínica ou consultório será necessário ajustar esses papéis com a entrada do(a) novo(a) médico(a) ou sócio(a). É preciso que em cada papel seja definido o que decidir, quem vai decidir e quando será decidido.
Cada médico toma suas decisões quanto ao tratamento e cuidado de seus pacientes. Eventualmente poderá consultar colegas, mas a decisão final é dele, assumindo riscos e responsabilidades.
Quando o assunto é societário, de administração, os riscos são diferentes daqueles diretamente ligados à saúde dos pacientes: estamos falando aqui de riscos tributários, trabalhistas, patrimoniais, responsabilidade civil e assim por diante. Qualquer problema se refletirá diretamente no patrimônio da clínica e/ou consultório e, portanto, dos sócios.
Assim, é muito importante o estabelecimento de regras de convívio para que essas decisões sejam tomadas baseadas em critérios que sejam aceitos por todos os sócios.
Como pensar nessas regras de convívio?
O primeiro passo que sugiro é definir quais são os assuntos a serem discutidos pelos sócios. Exemplos:
• Entrada e saída de sócios (parentes ou não) – qualquer parente pode entrar?
• Será exigido algum pré-requisito técnico, financeiro ou de experiência prévia para entrar na sociedade?
• E para a saída (ou entrada) de um sócio, como será feita avaliação do valor da clínica ou consultório para remunerar suas cotas?
• Para abrir clínicas-satélites ou outras unidades, quantos sócios devem estar de acordo?
• Aquisição de equipamentos ou reformar a clínica ou consultório, ou aceitar trabalhar com determinado convênio?
• Qual é a alçada que a(o) secretária(o) ou o(a) administrador(a) da clínica ou consultório tem para assumir despesas ou investimentos?
Em seguida, defina como serão contados os votos: por sócio, por quantidade de cotas que cada um possui, por tempo de casa, por família ou outro critério. A legislação já prevê algumas regras que devem ser obedecidas, mas ainda assim existem critérios que podem ser específicos de cada caso.
A próxima etapa seria a periodicidade de reunião dos sócios e votação de assuntos: semanal, quinzenal ou apenas quando surgir algum tipo de questão que requeira a presença deles?
Enfim, o que responder àqueles(as) que estão pensando na entrada de filhos(as) na clínica ou consultório? Usem a razão para estabelecer critérios e formas de decisão – tracem claramente os objetivos da clínica e definam o papel de cada um na condução da clínica ou consultório. Essas definições serão fundamentais para que a clínica ou consultório mantenham sua saúde financeira, bem como o desenvolvimento contínuo sem grandes solavancos por conta da mudança de comando.
Usem a paixão para acomodar o relacionamento familiar e assim preservar a harmonia familiar e aumentar a possibilidade de sucesso em seus negócios.
* Jeanete Herzberg é administradora de empresas graduada e pós-graduada pela EAESP/FGV. Autora do livro “Sociedade e Sucessão em Clínicas Médicas”. Membro do Conselho Consultivo da Sociedade Brasileira de Administração em Oftalmologia, gestão 2016-2018.